Dienstag, April 27

Última carta de Virgínia Woolf à Leonard Woolf

"Querido,







Tenho certeza de que estou enlouquecendo de novo.
Sinto que não podemos passar por outra daquelas
terríveis fases. E desta vez não ficarei curada.
Começo a ouvir vozes, e não posso me concentrar.
Assim, estou fazendo o que me parece melhor.
Você me deu a maior felicidade possível. Não creio
que duas pessoas pudessem ser mais felizes até
chegar esta doença terrível. Não consigo mais lutar.
Sei que estou estragando a sua vida e que sem
mim você poderá trabalhar. E você vai, eu sei. Está
vendo, nem consigo mais escrever adequadamente.
Não consigo ler. O que quero dizer é que devo a você
toda a felicidade da minha vida. Você foi absolutamente
paciente comigo e incrivelmente bom. Quero dizer isso —
e todo mundo sabe. Se alguém pudesse me salvar, teria
sido você. Perdi tudo, menos a certeza da sua bondade.
Não posso mais continuar estragando sua vida. Não creio
que duas pessoas tenham sido mais felizes do que nós fomos."






Virginia Woolf

Samstag, April 24

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Sim, ontem elas tornaram-se fortes. Um amontoado de vozes, todas bem corridas, justapostas, gritando, berrando absurdos irreconhecíveis. No fim exclamaram: 'tudo bem', então saí do transe e percebi que estava luzes acesas sozinha. Por enquanto perturbadoras não são, percebo multidão de almas vazias tantas faces abafadas de mim, o gozo sufocado e poderia realmente convencê-las a vir ao lado de cá, mostrarem-se minhas. Minha convicção de vida não é tão certeira quanto à de vocês, até porque pele, face, osso, espinha dorsal caixa torácica coração envolto por estimulantes remédios e um pouco de desprezo é morte letal, veneno letárgico e prefiro estar além pairando por entre esses ruídos gritantes os meus medos os meus habitares monstros, as minhas agonias as minhas exatidões dúvidas pergunto ao velho: 'como posso não estar em beiras frestas liminaridades e ser inteira sem parecer-me esdrúxula, sem cansar-me de minha voz e palavras desgarradas escritas? Sinto que morro um pouco ao fim de cada risada, ao fim de cada acontecimento absurdo indecente inesperado e percebo agora que não são os outros, mas eu própria a geradora de meus infernos'. A certeza de saber minha responsabilidade o câncer gestado nas minhas entranhas a minha - sim, minha propriedade - dor calcada na recusa da carne nojo do que me forma - as minhas formas. E esse não se faz problema maior - já o foi -, mas a saudade de ser dessas questões constituídos os meus terrores e saber-me superfície larga e rasa. Sinto minha dor agora dentro de um rio e o corpo submerso e preciso de força para o pé no chão para que correntezas fortes não façam do meu ar alimento faltante. Viveria só com os gastos e restos, estaria armada das velhas experiências e sabedorias e sei, estaria aberta ao afogamento, mas na menor e menos drástica das formas. Agora temo estar caindo, folhas e galhos resvalam no meu corpo, escapam às mãos. 
Sinto sua bondade, mas suas perversões me são mais caras.

Dienstag, April 20

"Agora vou embrulhar minha angústia dentro do meu lenço. Vou amassá-la numa bola apertada. Vou levar minha angústia e depositá-la nas raízes sob as faias. Vou examiná-la, pegá-la entre meus dedos."
Virginia Woolf.


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Esperando ver aonde colocarei o meu barco.

Freitag, April 9

Eu queria somente a lembrança vaga e nostálgica de todos vocês pelo resto da vida. Evitar mais contatos, mais vivências a dois, três e todos. Esquecer dessa loucura que me assombra, os restos espalhados e recolhê-los, silenciosa, luz de inverno. Refazer-me e ter de lidar, a cara mais lavada, com essas baixezas e covardias. Aprender a conviver com os meus fantasmas, as suas projeções em mim - somente. Deixar o vento coisa fria envolver-me e ir removendo, aos poucos, lodos, parasitas, vermes, nevrálgicas marcas abandonadas como espinhos por debaixo dos dedos. Cansei de estar com o outro, o outro estar comigo sem inteirezas - nem ao menos as mais singelas - olhares, formas, banalidades.
Desejo, hoje, não estar mais aqui. Perder o paladar, voz, pele, carne, entranhas, útero, cérebro, coração. Desfalecer, tombar devagar, como uma árvore raízes fortes no chão mas machadadas violentas no tronco. E um rastro grama abaixada ser a única prova de minha existência vegetal parca, inerte, em fechada floresta de assovios, trapaças e canções.
O falecimento de vocês em mim libido espalhar suas cinzas no mar revolto do oceano azul cor púrpura.
Quero enviuvar-me de mim.